Órgão confirma redução de projeção para o comércio e prevê problemas em países mais pobres
Por Assis Moreira, Valor — Genebra
O Conselho Internacional de Grãos (IGC, na sigla em inglês) enviou nota ao Comitê de Agricultura da Organização Mundial do Comércio (OMC) confirmando o rebaixamento de suas projeções para produção e comércio de diversas commodities nesta safra 2021/22, em meio a inquietações sobre segurança alimentar e pressão inflacionária global.
Com a guerra envolvendo Rússia e Ucrânia, dois dos maiores exportadores mundiais de grãos, o IGC diz que exportações adicionais de milho e trigo de países como Brasil, Índia e Estados Unidos, além da União Europeia deverão compensar apenas parcialmente os menores embarques a partir do Mar Negro.
Diante da disparada de preços, o comércio mundial de trigo deverá ser 3 milhões de toneladas menor do que indicava a previsão anterior do órgão, enquanto os de milho foram corrigidos para baixo em 7 milhões de toneladas — o Brasil é um dos quatro maiores exportadores mundiais de milho, junto com Argentina, EUA e Ucrânia.
Soja e arroz
Em razão de reduções na produção da América do Sul, por causa da seca em Brasil, Argentina e Paraguai, a previsão do IGC para a colheita mundial de soja em 2021/22 foi reduzida em 3 milhões de toneladas, para 350 milhões (queda de 5% ante 2020/21).
Com a redução da oferta, a perspectiva para os estoques caiu 1 milhão de toneladas, para 42 milhões, cerca de um quinto menos que no ciclo anterior. Com a diminuição das disponibilidades e as cotações elevadas, o comércio da oleaginosa cairá 2 milhões de toneladas. Para o IGC, a área colhida poderia crescer 2% em 2022/23.
A estimativa do órgão para a produção de arroz em 2021/22 foi elevada em 4 milhões de toneladas, para 514 milhões (1% mais que em 2020/21), refletindo em grande parte um aumento da produção na Índia. A China deverá aumentar as importações, de forma que a estimativa para o comércio em 2022 (janeiro a dezembro) subiu 1 milhão de toneladas, estável no ano como um todo. Ligado aos ganhos na Índia e em outros produtores-chave, a área global está projetada para um pico em 2022/23.
Produção e estoques globais
Globalmente, a produção total de grãos deve aumentar ligeiramente. Mas o consumo de trigo e grãos forrageiros deverão ser 8 milhões de toneladas inferiores ao do ano anterior. O volume do comércio global da safra 2021/22 foi reduzido em 9 milhões de toneladas, para 415 milhões.
Como reflexo principalmente de um acúmulo antecipado de estoques na Ucrânia, os estoques finais mundiais acumulados (agregado dos respectivos anos de comercialização local) são agora vistos como maiores. Com muito a depender do desenvolvimento da guerra na região do Mar Negro, as projeções de oferta e demanda para 2022/23 “são excepcionalmente tímidas”.
Protecionismo
O IGC relatou à OMC que a guerra já desencadeou uma série de respostas políticas em outros países, aumentando os temores sobre o aumento do protecionismo e suas consequências potencialmente adversas para as nações inseguras em termos alimentares. A turbulência mais ampla do mercado e os riscos de queda do crescimento econômico global poderão afetar a dinâmica da oferta e da demanda.
O aumento dos preços do petróleo e das commodities poderá ampliar a pressão inflacionária.
A invasão da Ucrânia pela Rússia e o pico de alta de preços das commodities agrícolas ampliaram a preocupação sobre a segurança alimentar especialmente em países dependentes de importação na Ásia e na África.
Mar Negro
Para o IGC, as ameaças imediatas estão centradas principalmente na interrupção dos fluxos de exportação. As cargas comerciais nos portos do Mar Negro estão suspensas na Ucrânia. Apesar de tentativas para ampliar as exportações por rotas ferroviárias através das fronteiras ocidentais do país, é provável que os volumes globais sejam limitados.
Um sistema de licenciamento de exportação foi recentemente introduzido para trigo, milho e óleo de sementes de girassol. Os carregamentos de cevada, centeio e aveia estão atualmente proibidos. Embora a extensão das perdas de infraestrutura seja desconhecida, os danos dos bombardeios às instalações portuárias, ferrovias e silos de armazenamento poderiam impactar os embarques a longo prazo na Ucrânia.
Com relação à Rússia, o IGC relata que a maioria dos terminais do país no Mar Negro estavam operacionais em meados de março — e, com algumas restrições, continuavam no Mar de Azov, localizado no noroeste da península da Crimeia, entre a Rússia e a Ucrânia. Os embarques podem ser dificultados também por restrições financeiras, comerciais e exigências adicionais de seguro de frete marítimo.
Fertilizantes
O IGC realçou, também, que a guerra aumentou as preocupações com o aperto nas cadeias globais de fornecimento de fertilizantes, maximizadas pelo transporte restrito para a região e pelas últimas sanções contra Rússia e Belarus, dois dos principais fornecedores mundiais de fertilizantes nitrogenados e potássicos.
A alta dos preços do gás natural, matéria-prima fundamental para a produção de fertilizantes nitrogenados, também contribuiu para as altas de preços. O aumento dos custos de produção poderia ter impacto nas próximas decisões de áreas, e implicações para o rendimento global e a qualidade das colheitas.
FONTE: https://valor.globo.com/agronegocios/noticia/2022/03/24/igc-reforca-preocupacao-com-seguranca-alimentar-global.ghtml