Fernando Canzian – Folha
Guerra traz, combinadas, crises típicas do fim do milênio / 15.mar.2022
Após bater recorde histórico em fevereiro, antes da guerra na Ucrânia, e ter previsão de alta de mais 20% por conta do conflito, os preços dos alimentos ganharam nova pressão nesta semana com grandes países consumidores e produtores de grãos passando a restringir exportações para elevar estoques.
Segundo a FAO (Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura), os estoques reguladores de grãos no mundo estão no menor nível em oito anos —equivalem a 29% da demanda global anual de grãos.
Em 12 meses até fevereiro, os preços dos alimentos no mundo já haviam subido 24%, em média. Embora a FAO previsse alta de mais 20% por conta da guerra, produtos como trigo já dispararam 30%, segundo o International Food Policy Institute, think-tank especializado no tema.
Juntas, Ucrânia e Rússia respondem por cerca de 25% das exportações mundiais de trigo; e de quase 15% das de milho e de outros produtos utilizados para ração animal —o que deve pressionar também preços de carnes.
No momento, quase todos os portos ucranianos estão fechados (alguns foram destruídos), e o país encontrará muita dificuldade para plantar sua nova safra na primavera do hemisfério norte. A FAO estima que ao menos 30% da área agriculturável do país estará totalmente comprometida em 2022.
Por precaução, o Egito anunciou nesta semana a suspensão de suas exportações de trigo, farinha, lentilhas e feijão. Com 102,3 milhões de habitantes, o país gasta mais de US$ 4 bilhões ao ano com importações de alimentos —70% do trigo vêm da Ucrânia e da Rússia.
A Indonésia, com população de 273 milhões, também adotou restrição pesada nas exportações de óleos vegetais (é maior produtora mundial de “palm oil”) utilizados na cozinha e em indústrias de cosméticos e chocolate.
Na segunda (14), o presidente do Banco Mundial, David Malpass, fez um apelo para que países não sejam agressivos em suas políticas de estocagem, que podem acabar agravando a escalada dos preços internacionais.
Em comunicado conjunto, ministros do G7 (clube de nações ricas) também pediram a todos os países produtores que “mantenham seus mercados alimentares e agrícolas abertos”.
A Folha questionou a Conab (Companhia Nacional de Abastecimento) e o Ministério da Agricultura sobre eventuais medidas que o Brasil possa vir a adotar em relação a estoques, mas não obteve resposta.