A Europa, em sua busca por liderar a agenda climática e ambiental, tem adotado uma série de medidas unilaterais que afetam diretamente o comércio internacional, particularmente para países exportadores de commodities agrícolas como o Brasil.
Essas ações, justificadas como iniciativas para promover a sustentabilidade e proteger o meio ambiente, levantam questionamentos sobre se estão realmente alinhadas aos princípios de comércio justo e ao desenvolvimento sustentável global. Um dos exemplos mais significativos dessas medidas foi a recente aprovação da Lei Europeia de Deforestação, que impõe restrições às importações de produtos agrícolas oriundos de áreas que sofreram desmatamento após 2020. A medida, que tem como objetivo frear o desmatamento em países fora da União Europeia (UE), exige que os produtos exportados para o bloco europeu, como soja, carne bovina, cacau, entre outros, estejam livres de desmatamento, comprovado por sistemas de rastreamento eficientes. Em princípio, essa é uma causa nobre e necessária, considerando a urgência da crise climática e da preservação dos recursos naturais.
No entanto, essas regulamentações unilaterais levantam preocupações sobre suas consequências, especialmente para os países em desenvolvimento. O primeiro ponto crítico a ser considerado é o impacto econômico que essas restrições podem gerar nas economias dos países produtores. No caso do Brasil, por exemplo, o agronegócio representa uma fatia significativa do PIB e das exportações nacionais, além de ser responsável por milhões de empregos diretos e indiretos.
Essas medidas podem, portanto, representar uma forma de protecionismo disfarçado de preocupação ambiental, prejudicando a competitividade dos produtos brasileiros no mercado europeu. Além disso, a implementação dessas regulamentações implica altos custos para os produtores, que terão que adaptar seus processos de produção e implementar novos sistemas de rastreabilidade, o que pode ser especialmente oneroso para pequenos e médios produtores.
Outro ponto a ser considerado é a soberania nacional. A imposição de regras ambientais por parte de um bloco econômico estrangeiro sobre o uso dos recursos naturais de outros países pode ser vista como uma interferência nos direitos soberanos dessas nações de gerirem seus territórios e suas políticas de desenvolvimento conforme suas prioridades internas.
A abordagem unilateral da Europa também desconsidera os esforços já realizados por países como o Brasil na preservação ambiental. O Brasil possui uma das legislações ambientais mais rígidas do mundo, com códigos florestais avançados e mecanismos de proteção da biodiversidade. A floresta amazônica, que é frequentemente alvo das críticas internacionais, tem sido protegida por políticas públicas e pela ação de inúmeros setores da sociedade civil.
A cooperação internacional seria uma abordagem mais adequada para enfrentar questões ambientais globais. Em vez de impor restrições unilaterais, seria mais eficaz e justo que as nações desenvolvidas colaborassem com os países produtores para implementar práticas sustentáveis, proporcionando recursos tecnológicos e financeiros para a transição para uma economia de baixo carbono.
A política ambiental da União Europeia deve ser ajustada para não prejudicar os princípios de equidade, justiça social e desenvolvimento sustentável global. Ao impor barreiras comerciais unilaterais, a UE corre o risco de aumentar a desigualdade entre países desenvolvidos e em desenvolvimento, contrariando os princípios básicos de comércio justo e os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da ONU.
Por fim, é fundamental que o Brasil continue a dialogar ativamente com a União Europeia e outras nações desenvolvidas, defendendo seus interesses no âmbito do comércio internacional, mas sem deixar de lado o compromisso com a sustentabilidade e a preservação ambiental. A resposta do Brasil a essas medidas deve ser equilibrada, focando na implementação de práticas sustentáveis que possam, ao mesmo tempo, proteger o meio ambiente e assegurar a competitividade de seus produtos no mercado internacional.
Em suma, as medidas unilaterais da Europa, sob a justificativa de sustentabilidade ou proteção ambiental, devem ser analisadas com cautela para garantir que não prejudiquem as economias dos países em desenvolvimento e que estejam realmente comprometidas com o combate à crise climática global, em vez de servir apenas a interesses protecionistas.
Por Charlene de Ávila e Néri Perin.